sexta-feira, 19 de junho de 2009

MINHA HISTÓRIA DAS COPAS



Nasci em 31 de maio de 1970, dia em que se iniciava a copa do México. Ela terminaria 21 dias depois com a vitória brasileira sobre a Itália, sabemos. Desta e da copa seguinte não tenho nenhuma lembrança, por motivos óbvios. Todas as edições subseqüentes tiveram relação muito importante com minha vida, para o bem ou para o mal. Mas destas eu falarei nos artigos seguintes.

Hoje quero falar da zona do limbo, da não lembrança, do não vivido. Interessante que muitas vezes pensei que gostaria de estar vivo em 2050, por exemplo, quando eu teria (ou terei?) 80 anos, para assistir à copa do mundo. Morrer significaria deixar de assistir às copas, da mesma forma que antes de nascer não pude vê-las. Coisa de maluco? Pode ser.

Em meu texto teatral “O teste”, publicado em 2004, o monólogo inicial da protagonista traz o seguinte trecho:

“Quem morre não está vivendo algo que nunca viveu: está apenas revivendo algo que sempre viveu antes disso tudo. Antes de sermos gerados por nossas mães, antes de estarmos em suas barrigas quentinhas e confortáveis, antes de tudo, não éramos nada. Quando morremos somos tão nada quanto éramos antes de nascer”.

É isso: sou em função das copas à que assisti. Assim, as copas de 30, 34, 38, 50, 54, 58, 62 e 66 são apenas números para mim, já que eu não existia. Minha relação com elas é estatística. Claro que sempre haverá aquela crônica inesquecível de um Nelson Rodrigues para nos desenhar com palavras a trajetória de nossas seleções nestas copas. Por isso mesmo precisarei pedir emprestada uma memória para falar de uma copa na qual eu existia, mas da qual não posso me lembrar.

Cabe frisar - antes de ir ao ponto que me interessa - que não há nada, nenhuma lembrança, nem mesmo emprestada, sobre a copa de 74. Eu tinha quatro anos e tudo o que sei sobre ela é o que todos sabemos através de jornais, revistas e televisão. Sabe aquela vez em que você tomou um porre e no dia seguinte não se lembrava de nada do que tinha acontecido? Pois é: a copa de 74 é o meu porre.

Voltemos à Copa de 70. Minha mãe deu à luz a este que vos escreve através de um parto normal às 7h15m da manhã do dia 31 de maio. Nem sei se ela se interessava por futebol, mas deveria estar muito ocupada se recuperando, cuidando de minhas fraldas, de minhas cólicas e me amamentando durante os 21 dias da copa.

Meu pai deveria estar dando um duro danado para garantir nossa sobrevivência já que nesta altura éramos quatro irmãos. Duas meninas, de 9 e 8 anos, um menino de 4, todos prestes a fazer aniversário, e eu. Não sei se a mais velha já trabalhava nesta época (se já não trabalhava iria começar logo depois, a vida dela nessa época não foi “bolinho”...), éramos muitas bocas a serem alimentadas.

De qualquer forma, não sei se minhas irmãs se interessavam ou não pela copa, se tinham condições de se interessar. A verdade é que nunca perguntei a elas isso nem tampouco elas me disseram algo sobre aquele período.

Veio de meu irmão, sendo que nem me lembro em que oportunidade, a minha memória acerca da copa de 70. Sei que era inverno e sei que era época de festas juninas. Vimos um balão no céu. Este balão - e sua beleza etérea para os olhos infantis - o levou ao dia em que o Brasil ganhou a final contra a Itália.

Segundo sua descrição, nunca houve um dia em que tantos balões estiveram no céu. Diante de tal deslumbramento, ele queria chegar até os balões. Para tanto, ele procurava pedras que pudesse escalar e, de sobre elas, dava saltos para o céu para tentar alcançá-los.

Na falta absoluta de memória daquela copa do mundo, empresto de meu irmão a poesia daquela vitória. Os gols de Pelé, Gerson, Jairzinho, Rivelino e companhia são balões cobrindo o céu para que crianças subam em pedras e saltem em direção ao éter.

Volto com a copa de 78.

3 comentários:

  1. Pois é querido irmão,
    no dia do tri, o céu de Vila Linda, onde morávamos, ficou repleto de balões coloridos. Você chegando, pequenino, e o céu super colorido. Nunca mais vi algo igual. Naquele época, quem pensava em incêndio? De novo, futebol e felicidade.

    ResponderExcluir
  2. E ainda tinha isso! O lugar se chamava Vila Linda!

    ResponderExcluir
  3. A minha primeira copa do mundo foi em 94. Quando me tiraram das bonecas pra assistir a prorrogação. Eu me assustei com os gritos e não gostei de ver o Brasil Campeão. Mas foi só a primeira vez.

    ResponderExcluir