quinta-feira, 24 de junho de 2010

MINHA COPA DE 2006



Em abril de 2005 fomos a Santa Cruz do Rio Pardo, terra de Beto e Umberto Magnani, descer o rio de bóia depois de fazer algumas apresentações do espetáculo pelo interior. Não me lembro mais a que cidades fomos. Talvez meu amigo Paulo Faria saiba. Foi meu último espetáculo com a companhia Pessoal do Faroeste .

É uma experiência impar: o rio calmo, o verde deslumbrante, os pássaros e as cores ao longo de três horas sobre grandes bóias.

Entretanto, naquele ano, o rio deu alguns recados. Sílvia Borges – que sempre se recusara a fazer o passeio por medo das águas turvas e que naquele ano decidiu superar seus receios – caiu no rio logo no começo da descida, sendo salva logo em seguida, o que não diminuiu seu trauma. Era só o começo.

Como éramos muito jovens e muito empolgados, sempre começávamos a descida no meio da tarde, algo inadequado a alguém que, como eu, sente frio rapidamente quando o sol se põe.

Naquela tarde tudo de errado parecia acontecer. Antes da queda da Sílvia uma das bóias extras rompera-se. Mau sinal. Eu, o mais leve de todos, me propus a fazer a descida numa bóia menor – não a de caminhão, como as outras – de forma a não comprometer a descida de nenhum de nós. Descíamos, então, sem nenhuma bóia extra.

Com o passar do tempo e com o frio aumentando, comecei a beber meu cantil de conhaque como forma de tentar me aquecer. O sol se pôs. Ó frio aumentava. A bóia pequena me obrigava a fazer um grande esforço para não bater as costas nas pedras quando passávamos pelas corredeiras. Hipotermia. Não havia mais luz. Eu ficara só. Perdi a consciência...

Quando acordei era noite e eu estava em algum lugar no meio do rio, nada e ninguém ao meu lado. Com as mãos remei até a margem do rio e me agarrei aos arbustos. Era difícil pensar. A bóia rompeu-se em contato com as raízes das árvores. Safei-me do rio. Um breu imenso. Sentei-me e chorei.

Não sei quanto tempo se passou até que ouvi vozes. Três pescadores. Um deles despiu-se para me aquecer. Andamos pela mata até chegar a uma estrada. Consegui dizer o nome do hotel onde estava. No meio do caminho Stella Marini, nossa produtora, surgiu em seu carro. Mais choro. Dormi.

Eu sobrevivera ao rio, à hipotermia, à minha irresponsabilidade. Era um milagre não ter me afogado. Foi a última vez que estive tão perto da morte.

Em julho conheci Juliana. Em outubro fizemos nossa primeira viagem. Em 16 de novembro começamos a namorar. Em 30 de dezembro quebrei o úmero. Em abril de 2006 rompemos – por 20 dias. Em 30 de maio fiz a cirurgia de retirada dos pinos do braço. No meu aniversário de 36 anos fomos ao zoológico.

Nosso primeiro jogo juntos – segundo minha lembrança – foi a partida contra o Japão. Vimos no telão da loja de conveniência do posto que ficava ao lado de minha casa na Pompéia. Eu dera aulas à tarde e daria aulas à noite. Tomei duas smirnoff-ice. O Brasil tomou o primeiro, mas fez quatro na melhor partida do Brasil naquele mundial.

Depois, o Brasil bateu Gana nas oitavas e pegou a França nas quartas, naquele jogo medíocre no qual tomamos o gol de cabeça enquanto o Roberto Carlos ajeitava a meia.

Eu chorei após a derrota, confesso. Mas só Juliana viu. Dormi no sofá depois do jogo. Sim, estava meio “borracho”...

Lembrei-me de Gol Anulado de João Bosco e Aldir Blanc:

Daquele gol até hoje meu rádio está desligado
Como se irradiasse o silêncio do amor terminado
Eu aprendi que a alegria de quem está apaixonado
É como a falsa euforia de um gol anulado

Em meu caso:

Daquele gol até hoje tudo em mim está remediado
Como se ele aplacasse todo o sofrer do passado
Eu aprendi que a alegria de quem é apaixonado
É como a tranqüilidade de quem tem um amor ao seu lado

Brega, né? É. Mas sou feliz.
Será que isso será a tônica de minha história das Copas daqui por diante? O fato de ser feliz finalmente, depois de pensar que eu fora talhado para a tristeza perene, fará com que minhas histórias sejam menos interessantes? As histórias anteriores eram mais profundas? Ser feliz é um desserviço a um artista? Confesso que tenho dúvidas. Mas vou tentar responder a isso nas copas que se seguirem...




A Cia Pessoal do Faroeste está em cartaz com a “Trilogia Degenerada”. Informações e reservas: 11-3362-8883.

2 comentários:

  1. Eliseu,
    mania essa que temos de ficar nos desculpando quando estamos felizes! Acho sim que podemos ficar mais bregas por isso. Mas e daí? Talvez seja também essa coincidência (?) de estarmos felizes já na nossa maturidade. Assim, fica a dúvida se estamos bregas por estarmos felizes ou porque a maturidade vai nos trazendo um quê de "caretice. Sei lá, não sei. Só sei que gosta de estar feliz, brega, careta ou qualquer outra coisa...

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  2. que louca essa histórias com os pescadores....
    eles foram seus anjos!

    Keila

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