À minha frente o jornal de hoje, 23 de julho de 2011. Não o li. Estive o dia todo ausente. Agora estou ausente, de maneira distinta. A manchete me conta que 87 morreram nos ataques na Noruega.
A Noruega não é aquele lugar que não fica no mundo, perto dos países baixos, para o qual as pessoas civilizadas se mudaram?
Será que foi isso que ela sentiu quando acordou, pela manhã? Que o mundo estava cada vez mais absurdo?
Tento não refazer seus passos. A boca amarga. O café amargo. O estômago contraído. Algum enjôo. O mundo girando ao redor. O sol brilhando e ela querendo que alguém fechasse a cortina. Vivo querendo que alguém feche a cortina por mim.
Razão não é uma coisa razoável. Nunca foi ontem, não será amanhã. O número de mortos na Noruega aumenta hora após hora. Na Noruega! Aquele lugar distante!...
Sair da cama, tirar o pijama, recomeçar... Tudo é tão trabalhoso! E tem algum sentido nessa coisa toda?
Pensamos nas pessoas que fazem diferença, que pensamos que amamos, que pensamos que sentirão nossa falta... Seriam – essas pessoas – motivo suficiente para levantarmos outra vez?
Voltemos a ela: na Noruega... Quantos mortos? Agora 92. A cabeça gira. Um cigarro, quem sabe? A nicotina engana, o cérebro pensa que a vida pode ser boa, essas coisas que nós achamos que sabemos, que os médicos juram que sabem...
Após o quarto ou o quinto cigarro o efeito já não é o mesmo. São 94 mortos nos países baixos –não, na Noruega! Países baixos são os outros que achamos que são civilizados, não confunda as coisas!
Está bem, vamos tentar um trago, um escocês, um vinho, algo que nos torne entorpecidos, os mortos chegaram a... A quantos? A tantos... Por diferentes motivos, aqui ou ali, em países ditos civilizados, em países de terceiro mundo, aqui em Londres alguém está morrendo agora mesmo.
Qual é mesmo o motivo? O objetivo, qual é? Alguém, por favor, pode fechar a cortina? Essa coisa nunca termina?
Uma seringa, então. Um roteiro revisto. Rasgo o roteiro? Queimo o roteiro ou uso o fogo para esquentar a colher? Tanto faz.
Onde é mesmo que guardo? Um guarda? Guardar o que? Quem? Eu? Eu e quem? Quem está comigo? Quem vai comigo? Só? Todos sós? O tempo todo? Que tempo? Não temos tempo. Todo o tempo, só isso: ir-se. Voltar-se. Voltar. Back. To Black. Injetar. Não pensar. Ir. Ir-se. E noite. E só.
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