Quando conheci Juliana foi como se estivesse me olhando no espelho. Aquela menina à minha frente era frágil, meiga, autoritária, exigente, delicada, sensível, altamente propensa a julgar as pessoas, muito dedicada aos amigos cobrando um preço alto por isso. Mas, acima de tudo, solicitava de todas as formas possíveis que todos ao seu redor a amassem de maneira incondicional.
Sabedor de meu fracasso, não foi difícil perceber que aquela menina também fracassaria. Todos fracassamos neste intento de sermos amados desta forma, mais dia, menos dia.
Narciso, soube quase de imediato que meu destino estaria voltado para dar àquela menina amor suficiente para nos libertar e, assim, prender-nos um ao outro sem culpa.
Aquela menina era o processo final através do qual eu me curara, era a prova de que eu mudara, de que eu deixara de ser a vítima sem tornar-me algoz. Mas para isso eu precisaria abrir mão de mim mesmo através dela, transmutar-me pela transformação dela, o que, contraditoriamente, poderia libertá-la para além de mim.
Aos poucos, porém, minha própria liberdade passava por abrir mão também deste intuito segundo o qual eu a transformaria – a ela! - como forma de me salvar simbolicamente. Era um egoísmo que não fazia mais sentido na medida em que o amor que nutria por aquela menina já tinha vida e motivações próprias.
Hoje, quando vejo que a menina se transforma dia após dia em mulher – ainda que guardando para mim seus traços de menina, dos quais gosto tanto! - sinto-me orgulhoso de ter alguma participação nisso.
Juliana não é nem nunca foi minha maior provocação, minha maior prova de rebeldia - como entenderam alguns – nem minha salvação – como preferem outros. Mas é minha maior prova de liberdade – uma liberdade aprisionante, terna, bela e tranquila – e de que também eu posso amar e ser amado, de que posso ser feliz ainda que uma tristeza perene nos envolva graças à nossa natureza soturna.
Vez por outra ainda me emociono com minha pequena. Seja por existir, simplesmente, seja quando usa parte de seus dias para cuidar das pessoas que ela ama. E hajam Walkyrias, Ulysses, Lavínias e Eurídices para dividi-la comigo! Sem falar de todos os cachorros, gatos, patinhos, leõezinhos, pandinhas e todo o zoológico que tanto a emocionam.
Sei que estou preso a ela desde os primeiros momentos, desde as primeiras dores compartilhadas, desde o primeiro rímel borrado pelas suas lágrimas. Jamais deixarei que a transformem em algo menor que o imenso amor que sinto por ela.